sábado, 13 de fevereiro de 2016

QUI DIGIT, BIS LEGIT - QUEM DIGITA, LE DUAS VEZES

CRÔNICAS PROF. FLÁVIO DA SILVA OLIVEIRA
OS LACERDINHAS
18-09-1966
Com este calor bárbaro, os “lacerdinhas” andam assanhadíssimos. Quem se atrever a atravessar o jardim, mormente se estiver usando camisa ou blusa amarela, fica todo salpicado pelos ativos e irritantes bichinhos, que não deram bola ao combate que a Prefeitura lhes moveu. A exemplo de outras cidades, já foi tentado de tudo para exterminá-los. Reduzem suas atividades mas, dentro em pouco, voltam mais ferozes do que nunca. A impertinência deles é tanta que existem até os que aconselham o uso de lança-chamas ou a derrubada total dos “fícus”, como únicos remédios para o mal. A verdade é que os bichinhos são travessos e sabidos. Enrolando-se nas folhas mais novas e tenras das árvores, ficam quase que inteiramente protegidos de qualquer ataque. E o sol, que atualmente está de estourar mamona, deixa-os mais ativos e insuportáveis. À tardezinha, com a fresca, vão-se aquietando, até sossegarem de vez, com a noite.
Aliás, li algures que o ciclo de atividades dos “lacerdinhas” vem diminuindo, paulatinamente, sem qualquer razão aparente, como que combatidos pela própria natureza. Por isso, sou contrário à derrubada das árvores, mesmo porque, de acordo com o velho ditado – não há bem que sempre dure, nem mal que perdure-o dia deles há de chegar. Mas, pensando bem, não há mesmo motivo, bastante sério, para se combater os “lacerdinhas” com tanto ardor. Afinal de contas, o Onipotente sabe o que faz: notem que os bichinhos só agem com o calor do dia. Incomodam, portanto, apenas aqueles que, não tendo o que fazer, ficam pelo jardim, no dolce far nienti”. (É claro que os motoristas de praça formam a exceção). Imaginem vocês se as atividades dos “lacerdinhas” fossem invertidas, isto e´, se ficassem quietinhos com o calor e agissem com o frescor da noite: na certa, os namorados não mais procurariam o jardim público, porque têm muito mais o que fazer de que enxotar bichinhos, e a praça ficaria soturna, sem a garrulice da mocidade.

Está tudo certo, portanto, inclusive o “lacerdinha” que penetrou em meu olho, num dia destes, fazendo-me penar como danado, pois encontrei uma alma boa e caridosa que, com a pontinha do seu lenço, todo perfumado, alivio-me do monstro, imunizando-me contra todas as penas que todos os “lacerdinhas” do mundo possam causar-me...

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