Texto copiado do Jornal do Porto
28/03/1987
Dorivaldo Américo da Silva (Ninão)
Peço a benção da família Ferreirense, favor divino de
gratidão pela leitura dispensada nesta coluna de todo final de semana.
O retrospecto de nossas antigas casas de comercio varejista,
filiado à saudade que sentimos, torna o antigo “mil réis” mais forte do que o
atual “cruzado”, assassinado recentemente pelos enganadores do povo. Mas esta é
outra história.
A Casa Betting, competindo com o “José Baixo”, “Empório do
Povo”, “Santa Clara” e “Empório do Loureiro”, fixava preços baixos, valendo mil
e quinhentos réis um par de sapatos couro fino, setecentos réis o quilo da
manteiga pura, trezentos réis o quilo da bolacha de leite ou maisena, sendo
quase de graça o quilo de fubá “mimoso” tão antigo como o próprio moinho.
A Casa Betting localizava-se numa esquina da Rua Mathias
Cardoso, confluência com a Rua Cel. Procópio de Carvalho, passagem obrigatória
para “Vila Pinto”. Tinha tão boa freguesia quanto que acima citei. Era uma
mistura de fregueses sítio-cidade, que levavam o dinheiro na mão.
O proprietário, senhor Waldomiro Betting, em 1936 adquiriu de
Martins Ansem um lote de terras, medindo datas por inteiro, nele construindo o
armazém que se tornou tradicional.
Devido ao desabamento ocorrido durante uma madrugada em que
ninguém saiu ferido, seo Waldomiro antecipou o encerramento da firma, uma vez
que, já de certa idade, tinha intenções de “fechar as portas” e gozar o
restante de sua vida.
A frente da Casa Betting muitas vezes serviu de campo de
futebol da molecada, bem como para o “barra-bola”, “pique”, “passa-mel”,
“cachuleta” e “soldado e ladrão”, até às 21 horas, quando as mães chamavam seus
filhos para lavar os pés e dormir, pois o sineiro da estação já havia “batido
as horas”.
A importância paga por seo Waldomiro a seo Martins Ansem foi
de “onze contos de réis” pelo terreno.
A população encontrava de tudo na Casa Betting, desde ovos caipiras
até “armarinhos” e materiais de construção, a preços módicos.
Pedro Fabiano, Carlos Mourão e Arlindo Pimenta foram alguns
dos empregados daquela firma comercial, mas foi Carlos Mourão que teve juntado
a ela sua aposentadoria.
O filho do seo Waldomiro, David Betting, era que todos
estavam acostumados a ver servir ao balcão. Sempre atencioso e bom David sorria
quando seu pai, para agradar o comprador aplicava-lhe o clássico “tapinha” nas
costas.
Foram quase cinquenta anos de atividades junto ao comercio
varejista da cidade, atuando numa esquina de quarteirão pioneiro, em cujo muro
um dia deixei meu nome escrito a carvão...
Por essa e por outras é que lhe peço a benção, meu irmão.